sexta-feira, março 31, 2006

Palavras Interditas (*)

Os navios existem, e existe o teu rosto
encostado ao rosto dos navios.
Sem nenhum destino, flutuam nas cidades
partem no vento, regressam nos rios.

Na areia branca onde o tempo começa,
uma criança passa de costas para o mar.
Anoitece. Não há dúvida, anoitece.
É preciso partir, é preciso ficar.

Os hospitais cobrem-se de cinza.
Ondas de sombra quebram nas esquinas.
Amo-te... E entram pela janela
as primeiras luzes das colinas.

As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.

Dói-me está água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos nocturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.

E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.

Eugénio de Andrade (1923-2005)

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(*) não tenho por hábito publicar aqui poemas de autores conhecidos.

1 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

O poema é lindo, no entanto prefiro os teus originais!
Aí está descrito o cenário perfeito para os românticos / apaixonados! M. J. C.

31 março, 2006 22:12  

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