quinta-feira, fevereiro 09, 2006

A Coabitação – o terceiro momento


No próximo dia 9 de Março, quando o Prof. Cavaco Silva tomar posse como Presidente da República, inicia-se um período político de “coabitação” (um Presidente de centro direita, um governo socialista) que já vem tendo alguma tradição em Portugal.
Quando em 1986 o Dr. Mário Soares foi eleito Presidente da República, à segunda volta, apoiado pela esquerda, e derrotando o candidato do centro direito e actual Ministro dos Negócios Estrangeiros, Prof. Freitas dó Amaral, encontrou já Cavaco Silva como primeiro-ministro, presidindo a um governo minoritário do PSD que posteriormente viria a cair em resultado da aprovação de um Moção de Censura pela Assembleia da República.
A intervenção de Soares nesse momento de crise, optando por dissolver o Parlamento e convocar novas eleições (ao invés de empossar um governo de coligação entre o PS e o PRD, que a disposição de forçar na Assembleia permitiria) – que viriam a dar a Cavaco e aos social-democratas a primeira de duas maiorias absolutas – permitiu-lhe granjear grande prestígio entre os portugueses, traduzido nomeadamente na convivência pacífica com o governo de direita durante todo o primeiro mandato e na sua confortável reeleição (com mais de 70% dos votos) em 1991, contando com o apoio público do PSD.Mas ao pacifismo do primeiro mandato sucedeu-se uma “coabitação” conturbada, marcada por um eminente conflito institucional entre Belém e S. Bento. Do lado do governo eram as tentativas de afirmação da autoridade, os protestos contra as designadas “forças de bloqueio”; a Presidência respondia com vetos políticos a legislação sensível, intervenções críticas e por vezes excessivamente violentas, como a proferida pelo Presidente Mário Soares na abertura do Congresso “Portugal que Futuro? – 1994 – que terminou com um diagnóstico marcadamente negativo da actuação do XIIº Executivo.
O resultado das eleições legislativas de 1995 e particularmente a derrota de Cavaco nas presidenciais do ano seguinte, permitiram a Soares sair de Belém cumprindo o velho sonho dos líderes partidários desde o 25 de Abril: “um Presidente (Jorge Sampaio), um Governo (o de António Guterres), uma maioria (a do Partido Socialista que elegera 112 mandatos, muito próximo da maioria absoluta) ”.
Com Jorge Sampaio, o terceiro Chefe de Estado após a aprovação da Constituição, a “coabitação” viria a ter lugar no início do segundo mandato quando em 2002, em resultado da demissão do governo socialista no final do ano anterior, Durão Barroso se torna primeiro-ministro de um Executivo de coligação. A relação do Presidente com os governos de direita foi tendencialmente pacífica, sem grandes incidentes mediáticos. Mas por isso não menos atenta, zelosa da responsabilidade política do Executivo perante o Chefe de Estado. A prova disso está na dissolução parlamentar feita por Sampaio em 2004, como resultado de um conjunto de “erros, contradições e bloqueios” do governo de Santa Lopes, que minaram a confiança política que o Presidente nele tinha depositado ao lhe dar posse.
A “coabitação” é um processo comum aos Sistemas de Governo Semi-Presidenciais de matriz Francesa e tem como paradigma a controversa relação entre as principais figuras do Estado Francês até meados dos anos 90: François Mitterrand (um presidente socialista) e Jacques Chirac (um primeiro-ministro do centro-direita).
Como será a relação Cavaco-Sócrates? A repetição do pacifismo apresentado pelo Presidente Sampaio? Ou o regresso em termos revanchistas da conturbada coexistência política do segundo mandato de Mário Soares?
Qualquer que seja o destino que a História reserve a este novo ciclo político, é importante que os seus protagonistas, compreendendo a situação delicada em que o país se encontra, saibam afastar os jogos de bastidores e “cooperar”com vista à persecução do interesse comum (!), no fundo o fundamento do voto de confiança que ambos receberam quando foram chamados ao exercício de funções.
Além do mais, num Sistema Político Constitucional como o nosso, marcado por uma separação de poderes contrabalançada pelos famosos checks and balances, a “coabitação”, se gerida com isenção e parcimónia, pode ser uma forma inteligente de equilibrar as competências constitucionais dos principais órgãos de soberania e prover a sua moderação recíproca, evitando-se as tentações “laxistas” e “colaboracionistas” muitas vezes proporcionadas pelos períodos de “confluência”.

1 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

A eaperança é a última a morrer! Vamos esperar que saibam "coabitar".
M.J.C.

09 fevereiro, 2006 18:17  

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