No tempo do Regime Autoritário costumava dizer-se que os temas de grande interesse nacional se reconduziam à “trilogia dos F’s”: Fado, Folclore e Fátima. Tal elenco de assuntos, superficiais, próprios à evasão, desviava as atenções do Estado e do Poder Político, e não deixava de ser agradável para quem o exercia, que procurou, como se sabe, envolver-se sempre em clamores de unanimidade .
Actualmente, em Democracia, parece que muito do que acabei de referir continua a fazer sentido, e pelo menos o futebol de alto nível, permanece de certo modo uma espécie de “ópio do povo”.
Há dois anos, a euforia do EURO 2004, anestesiou os portugueses de todos os acontecimentos relevantes que se foram produzindo nessas três semanas: o resvalar da economia para a crise, a discussão dos líderes europeus em torno da sucessão de Romano Prodi e o convite a Durão Barroso para ocupar o cargo, o qual se veio a concretizar alguns dias mais tarde na demissão do XVº Governo Constitucional, e na posterior decisão do então Presidente, Jorge Sampaio, em convidar Santana Lopes para formar um novo Executivo.
Este ano, em pleno Mundial de Futebol (o quarto em que Portugal participa, e o segundo em que passa da fase de grupos com prestações globalmente positivas) as atenções dos portugueses estiveram praticamente centradas na epopeia da selecção nacional em terras germânicas, e não fosse na quarta-feira passada os franceses estragarem a festa (mais uma vez!), dir-se-ia que, até agora, o clima continuaria a ser de euforia. Entretanto, silenciaram-se os protestos pelo encerramento de maternidades, pelas reformar de fundo em sectores sensíveis, as greves pararam (ou pelo menos deixaram de ter cobertura mediática significativa) e o governo remodelou-se discretamente com a saída de Freitas do Amaral, substituído por Luís Amado, e a entrada de Nuno Severiano Teixeira para Ministro da Defesa Nacional.
Agora que a competição está prestes a terminar, deveríamos voltar à normalidade mediática. Mas entretanto vêem as férias, e em tempo de férias não se pensa em desgraças. Por isso, talvez lá para Setembro, com muita calma, pode ser que os portugueses voltem a ter em mente o que realmente interessa.